ProjectO SeFarad, Vol.2
MU0118 2017
Palavricas d'amor
Noa Noa Ensemble
Filipe Faria
Tiago Matias
01 Durme, durme hermozo hijico 4'51
02 No vo comer ni vo beber 3'17
03 En la mar hay una torre 4'43
04 Lavava y suspirava 4'02
05 Para qué quero yo más bivir 2'31
06 Don Amadí 3'05
07 Secretos quero descuvrir 5'05
08 Esta montaña d'enfrente 3'25
09 Mi suegra la negra 4'50
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ProjectO SeFarad, Vol.1
MU0117 2016
De la mar
Noa Noa Ensemble
Filipe Faria
Tiago Matias
01 Una pastora yo amí 4'04
02 Adío querida 5’06
03 La rosa enflorece 4’03
04 Cuatro años de amor 4’07
05 La galana y la mar 5’44
06 Descanso de mi vida 3’58
07 Durme, durme 4’51
08 Hija mía, mi querida 2’53
09 Avrix mi galanica 4’42
10 Yo m’enamorí d’un aire 4’44
11 Morena me llaman 3’40
12 A la una yo nací 4’06
13 Por qué llorax blanca niña 4’17
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Projecto Sefarad
O projecto “Língua” do Ensemble Noa Noa oferece uma selecção de canções sefarditas; estas foram remodeladas de maneira criativa, assumidamente contemporânea, pelo projecto Noa Noa, que procurou acentuar neste reportório a sua ligação à cultura ibérica.
Canção é um termo genérico: de facto temos aqui, sobretudo, canções de amor; mas também duas canções de boda e um fragmento do romance narrativo La partida del esposo, iniciado pelo verso «Por qué llorax blanca niña». O adjectivo «sefardita» remete, num sentido estrito, para a diáspora dos judeus de origem ibérica: quer os muitos expulsos no final do século XV, quer os convertidos à força ao cristianismo ou seus descendentes, que abandonaram depois a Península para retomar a religião hebraica. Em suma, trata-se de canções tradicionais de uma população judaica geograficamente dispersa mas com raízes ibéricas comuns.
A língua destas canções é o «ladino» em sentido genérico (ou judeo-espanhol). Trata-se de um linguajar cuja base é o castelhano de c. 1500, mas que incorpora influências aragonesas e portuguesas, e também termos e expressões oriundas das línguas correntes nas áreas onde os sefarditas se estabeleceram (incluindo o árabe, o albanês, o servo-croata, o turco e o persa). Ocasionalmente, há até construções sintácticas decalcadas do hebraico. O «ladino», falado aindahoje por uma minoria de sefarditas, pronuncia-se frequentemente de maneira mais próxima do português do que do castelhano moderno, porque a sonoridade do castelhano, no Renascimento, se distinguia menos do português do que na actualidade.
Os textos das canções chegaram até nós em múltiplas versões; como nem sempre os seus inícios coincidem, os estudiosos baptizaram os textos de circulação mais alargada com um título de referência: assim, «A la una yo nací» é uma versão de Las horas de la vida, e «Durme, durme» corresponde a La hermosa durmiente. Alguns dos poemas têm uma forma arcaica, de matriz medieval, mas a maioria segue as convenções da poesia ibérica do período moderno, com uso de quadras (por vezes expandidas por uma exclamação intercalar semanticamente neutra, como em «Hija mia, mi querida»). É no romanceiro que os arcaísmos são mais notórios. Porém, maior antiguidade formal, do tempo das cantigas d’amigo (c. 1200) ou anterior, têm as estrofes de dois versos pontuadas por um refrão curto, como em La galana y la mar; sendo também dessa época o paralelismo usado em «Avrix mi galanica», versão de Todos son inconvenientes.
No que concerne à temática, a canção de boda remete para imaginários antigos e para práticas e expectativas sociais hoje completamente caídas em desuso. La llamada a la morena (iniciada pelo verso «Morena me llaman») fala-nos de um noivado que, nalgumas versões, prenuncia uma viagem numa nau, e aqui é perturbado pelo sonho da noiva adolescente de vir a casar com um príncipe. Já em La galana y la mar há um pano de fundo que é o dia do banho pré-nupcial; a letra parte da tradição pagã ibérica do banho num braço de mar, no qual a noiva é acompanhada pelas amigas solteiras; mas algumas versões remetem para a tradição islâmica de embelezamento no edifício dos banhos públicos, onde a noiva segue um longo roteiro de preparação estética, acompanhada por amigas, familiares, e músicos, antes de ser devolvida à casa dos pais.
Quanto à música, este é normalmente o aspecto mais recente das canções sefarditas recolhidas da tradição oral no século XX. Nos géneros profanos, e especialmente na canção de amor ou de entretenimento, o gosto melódico era muito permeável às tradições musicais circundantes. Não temos transcrições ou gravações de canções sefarditas anteriores a 1911; as primeiras recolhas sistemáticas foram feitas por Manuel Manrique de Lara no Mediterrâneo oriental e em Marrocos, e Alberto Hemsi, apenas no Oriente. Desenganem-se, pois, aqueles que julgam encontrar na canção sefardita sonoridades típicas da época da expulsão; a renovação da tradição, condição para a sua continuidade ao longo das gerações, passou sempre pela actualização musical. Daqui se conclui que Noa Noa está, do ponto de vista histórico, em excelente companhia.
Manuel Pedro Ferreira
PROJECTO CANCIONEIRO SEFARDITA
“O contributo dos judeus portugueses para a História de Portugal não se resume a paginar a cronologia do país. Vasta e enorme, marcante e gloriosa, intensa e interveniente, a amplitude da prestação, justamente, alteado património, prossegue a influir e a inspirar o que construímos em Filosofia, em Cultura e em Ciência”. Miriam Assor, Judeus ilustres de Portugal, 2014
Perguntar quando chegaram os Judeus ao território português é uma questão sem resposta. Sabemos apenas que chegaram à Península Ibérica ou sefarad numa das suas múltiplas diásporas com registos desde os sécs. II-III. A sua presença entre nós está comprovada por duas lápides encontradas no Algarve (Lagos), datadas do séc. VI, pelas referências escritas datadas do século VIII-IX em Coimbra, e uma lápide latina com menorah a evocar a sepultura de um seguidor de Moisés em Mértola, que poderá fazer recuar a presença dos Judeus ao século V.
Durante o período muçulmano, os judeus sefarditas dispersaram-se pelo território, sobretudo a sul do Douro, potenciando o intercâmbio cultural no seio da península ibérica.
No Portugal de outrora os judeus dependiam do Rei, que através de cartas de privilégio concedia a permissão de residir, trabalhar, negociar, exercer um ofício, seguir a sua religião, ser julgado pela sua lei (o Talmud) e ser sepultado segundo o seu ritual.
A actividade de artesãos e negociantes obrigava-os a deslocações por todo o reino, do que as cartas de foral concedidas aos concelhos dão testemunho. Alguns constituíram uma elite cortesã, como Ibn Yahia ou Negro, almoxarifes-mor do Reino. É nesta família que D. Afonso III, em finais do século XIII, vai escolher o rabi-mor, cargo que nela permaneceria ao longo de gerações até meados do séc. XV. Abraão Negro que era também físico do rei, foi o último representante do cargo
As comunidades de judeus organizavam-se em comunas, cujo centro era o complexo formado pela sinagoga, casa de oração, câmara de vereação, tribunal e escola, sob a direcção de rabis nomeados pelo rei a título vitalício. Em meados do século XIV os rabis passaram a ser eleitos, assim como os homens bons da câmara da vereação da comuna, traduzida num micro concelho judaico dentro do concelho cristão.
A comuna dependia da autorização régia, e por vezes, do bispado, para erguer uma nova sinagoga ou alargar a existente, sendo obrigada a pagar o dízimo ou outro tributo acordado à igreja.
Até ao séc. XIV, as judiarias apresentavam uma centralidade urbana ditada pelo seu papel nos sectores administrativo e comercial. Posteriormente o crescimento económico da burguesia cristã acentuou rivalidades e antagonismos que, agravados pelas pestes, exacerbou ódios e conduziu ao recolhimento das comunidades judaicas ou à sua transferência para zonas periféricas delimitadas.
Em finais do século XV, aquando do édito de expulsão dos judeus do reino de Portugal (Dezembro de 1496), a maior parte dos concelhos tinha a sua comuna ou a sua judiaria, apesar de nem todas possuírem rabi e câmara de vereação.
Pressionado pelos Reis Católicos, mas consciente que não podia perder esta força intelectual e económica, D. Manuel desenvolveu uma estratégica da conversão e baptismo forçados, proibindo as inquirições aos cristãos-novos durante 20 anos. Sinal de adaptação, ganharam mobilidade, tanto geográfica, como social, misturando-se com os cristãos-velhos e chegando a ingressar na nobreza, nas ordens militares e na universidade. Mas ser cristão-novo significava viver no medo e na desconfiança, mesmo quando as leis, como o Perdão Geral de 1605, pareciam abrir horizontes.
No que se refere à Beira Interior, pertencem a D. Dinis as mais antigas referências a comunas de judeus.
Até ao séc. XV a informação sobre a população judaica residente neste território é escassa, excepção feita à Guarda, cujas casas da judiaria pertenciam ao rei, e Trancoso pelo poder económico detido pela comuna. Relativamente à região de Idanha-a-Nova surgem menções ao pagamento de impostos por judeus ou às rendas das judiarias de Monsanto, Proença-a-Velha e Salvaterra.
Após o Édito de Expulsão de Castela, a população judaica aumentou consideravelmente na região, fixando-se junto à raia pela maior facilidade das relações comerciais, clandestinas, e familiares.
Os processos da Inquisição mostram-nos comunidades prósperas, onde o cristianismo escondia um judaísmo clandestino. Este relacionamento fechado, quer familiar, quer económico, permitiu-lhes viver numa atitude híbrida: exteriormente cristãos, baptizados, crismados e frequentadores da igreja e dos sacramentos, membros de confrarias, e, ao mesmo tempo, continuadores da tradição religiosa judaica no interior das suas famílias e casas.
No início do século XVII, regista-se um decréscimo populacional, devido a uma conjuntura de fome, epidemias, recrutamento forçado e viagens para o ultramar. A par disso, muitas localidades perderam pessoas que fugiram à Inquisição. São numerosos os processos levantados aos moradores do Fundão, Covilhã, Guarda, Idanha-a-Nova, Penamacor e Castelo Branco. No concelho de Idanha-a-Nova, em 1631, foram arrolados para pagamento do juro do Perdão Geral mais de 75 cristãos-novos moradores em Idanha-a-Nova, Monsanto, Proença-a-Velha, Medelim, Salvaterra e Segura. A absolvição e o perdão, que teoricamente eram concedidos aos confitentes, rapidamente se transformavam numa longa tortura para todos (confessos, denunciados e denunciadores).
As tensões e ódios agitaram o seio dos cristãos-novos e as denúncias atiraram famílias inteiras para o cárcere e para a miséria. Muitos idanhenses tentaram refazer a vida fora do país.
Destacamos a família de Diogo Nunes Ribeiro, cristão-novo, nascido em Idanha-a-Nova em 1668, médico no Mosteiro dos Dominicanos em Lisboa. Acusado de judaísmo, que confessou sob tortura, foge para Londres. Mudou o seu nome para Samuel. De lá emigrou para a América, sendo um dos fundadores da cidade de Savannah, na Geórgia. Diogo Nunes era tio materno de outra grande personalidade, Ribeiro Sanches, que seguiu as pisadas do seu tio e se tornou médico e grande intelectual. Nascido em Penamacor, era filho de Simão Nunes “Flamengo”, de Penamacor, e de Ana Nunes Ribeiro, de Idanha-a-Nova, abastados comerciantes cristãos-novos da Beira Baixa. Denunciado à Inquisição pela prática de judaísmo, conseguiu escapar ao cárcere, exilando-se para o resto da vida. Foi médico no Corpo Imperial dos Cadetes de São Petersburgo e de Catarina II da Rússia, tendo terminado os seus dias em Paris dedicando-se à ciência e ao pensamento. É um vulto maior da ciência e cultura europeias do século XVIII.
As investigações levadas a cabo corroboram a presença histórica das comunidades judaicas no território do Município de Idanha-a-Nova, das quais permanecem inúmeros vestígios, com destaque para a Rua da Judiaria em Medelim, possivelmente ligada à Judiaria de Monsanto. Trata-se de um património histórico e cultural multifacetado com um elevado potencial que abre novas linhas de investigação, cujas referências ainda são perceptíveis, merecendo ser salvaguardadas e valorizadas.
Entre estas, a música assume um lugar de especial relevo, pois são indubitáveis os traços da partilha feita ao longo do tempo. Sem fazer caso de fronteiras políticas e culturais, estamos aqui perante um património comum às tradições judaica, cristã e muçulmana. Um legado que serve de suporte à proposta do projecto Noa Noa, que chega até nós num eco magistral do esplendor das três culturas peninsulares.
Patrícia Dias e Paulo Longo Município de Idanha-a-Nova | Divisão de Cultura (O Município de Idanha-a-Nova integra a Rede das Judiarias de Portugal desde 2014)
ProjectO LÍNGUA, Vol.2
MU0114 2015
Língua, Vol. 2
Noa Noa Ensemble
Filipe Faria
Tiago Matias
01 Por riba se ceifa o pão 5’05
02 Argizagi ederra 3’05
03 Ayer vite na fonte 5’08
04 la mare de Déu/Els pobres traginers 3’54
05 Ya cantan los gallos 3’38
06 El cant dels ocells 3’03
07 Ró-r´ó 3'53
08 Llenos de lagrimas tristes 3’32
09 La Margarideta 2’59
10 Negra sombra 3’23
11 Iruten ari nuzu 4’54
12 Ya las sombras de la noche 2’50
13 Ganinha, minha ganinha 3’37
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ProjectO LÍNGUA, Vol.1
MU0112 2014
Língua, Vol. 1
Noa Noa Ensemble
Filipe Faria
Tiago Matias
01 Tanchão 5'07
02 No piense Menguilla ya 4'37
03 El testament d’Amèlia 4'16
04 Baila nena 3'22
05 Aurtxoa seaskan 4'00
06 Virgem da consolação 4'24
07 Díme, paxarín parleru 3'33
08 Pur beilar el pingacho 3'57
09 Todo me cansa 3'32
10 El mestre 4'31
11 Agora non 3'17
12 Meu amor me deu um lenço I/II 3'34
13 Pues quexar sé 2'16
14 Mira-me, Miguel 2'45
15 El gavinet de los talls & Cançó de pegaire 2'50
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Projecto Língua
A liberdade criativa que se vivia na Europa da viragem do século XIX para o século XX(1) encontra paralelo a História da Música Ocidental do século XVIII no qual o músico era formado para saber cantar, tocar um ou mais instrumentos, improvisar, compor e dirigir. A tradição de resposta sem fronteiras ao apelo criativo é tão antiga como o Homem e volta a ter eco nas tendências recentes da moderna prática da Música Antiga com a constatação de que o músico no passado tinha uma formação multifacetada que contrasta com a super-especialização a que se chegou no século XX e XXI. A própria redescoberta dos instrumentos históricos e das suas técnicas de execução tem vindo a iluminar o passado, mas ao mesmo tempo tem servido de inspiração a compositores e músicos contemporâneos para novas linguagens e estéticas.
Todas as línguas mudam com o tempo. Evoluem e adaptam-se aos usos inovadores das comunidades, às suas idiossincrasias e hábitos. A língua não pode ser entendida como uma entidade imutável, estanque, parada ou desenhada no tempo e pelo tempo. Ela é, pelo contrário, resultado de uma dinâmica imensa da mesma forma e com o mesmo fulgor da comunidade ou da humanidade que muda… vagarosa mas imparável.
Dedicado à memória colectiva definida pelas diversas culturas e línguas ibéricas, "Língua" é uma manta de sons "para além do Ebro" que resulta no português, castelhano, mirandês, galego, asturiano, basco ou catalão. Este novo projecto de Noa Noa viaja entre o que há de mais comum e mais diferente a História da cultura ibérica explorando as fronteiras geográficas, culturais e conceptuais da tradição e da ancestralidade com a contemporaneidade ou a interculturalidade...
Filipe Faria Lisboa/ldanha-a-Nova, 2013/2014
(1) O nome do projecto é inspirado no inovador livro de Paul Gauguin de 1901 no qual o artista descreve os tempos passados em retiro criativo na Polinésia francesa, em especial no Tahiti. Envolto em polémica, tanto Gauguin como o seu Noa Noa são ainda hoje sinónimos de liberdade criativa.